20 junho 2021

eu apagando

tive um sonho instigante. em um dado momento da dada trama, dois homens velhos se abraçavam chorosos e culposos.

"-- pronto, eu já apaguei tudo! está tudo apagado! agora a gente só vai ter de lidar com isso na nossa memória.", num tom forte, apesar de temeroso, era o que dizia um para o outro. a última poesia que publiquei aqui foi ditada por esse sonho.

interessante que dei a ela o nome de "sobre memórias". e agora penso no 'sobre' não como 'a respeito de', mas como 'acima', 'por cima'. dando-me a impressão de viver pondo algo em cima das memórias. não falando delas mas as cobrindo. agora... cobrindo como quem não quer ver ou como quem quer acobertar?

no sonho, o tom das coisas é mesmo de um crime. mas penso sobre narrativa, sobre lembrar para não esquecer e, com isso, não repetir. lembrar como elaboração. 

tola de mim supor que tenho alguma deliberação sobre isso. memória é coisa que se impõe.

o mais inacreditável é que, não bastasse a relação estranha que comecei a perceber de mim com meus registros, meus arquivos e backups sofreram também algum delete. vim motivada ao encontro das galerias e pastas dos aparelhos e notei que muitas fotos e lembranças sumiram. e, nesse caso, eu não tive responsabilidade alguma. quer dizer, mesmo em busca de restaurar meu trato com o passado, parece que têm coisas que devem mesmo se esvair.

talvez o meu imaginário sobre a chegada de minha terceira década, algo que venho meditado consideravelmente, esteja influenciando essa atmosfera de refletir a propósito de quem sou, o que fiz até aqui, qual minha história, etc. talvez seja o retorno de saturno, para dialogar com a astrologia. mas acho mais que se trata de confiar no caleidoscópio inconsciente e suas escolhas do que deve ser rememorado a cada momento, conforme a ordem da nossa fila de subjetividades à espera de atenção. acho.

sempre acho. nunca encontro.






sobre memórias

isso 
essa coisa
assim
de apagar

vem me gerando um custo
desgosto
desgate
a
pa
gar